PERGUNTAS FREQUENTES SOBRE JUROS DE OBRA
Informa o Cliente que celebrou contrato particular de promessa de compra e venda junto à determinada incorporador, tendo como objeto uma unidade residencial autônoma. A fim de captar recursos para a aquisição do imóvel, o cliente formalizou com a CEF o contrato por instrumento particular, nº xxxxxxxx, no valor de R$ xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx.
Afirma o cliente que embora tenha decorrido o prazo da fase de construção sem a entrega do empreendimento, de forma indevida, continua a arcar com os pagamentos mensais correspondentes aos juros mensais como se dentro da fase de construção ainda estivesse.
Sendo assim, o cliente formula os seguintes questionamentos:
- Em caso de Ajuizamento de Ação, quem deve ser responsabilizado?
- A cobrança de juros/taxa de evolução de obra é ilegal?
- Essa taxa pode continuar a incidir mesmo após a fase pactuada?
- É possível formular o pedido de repetição em dobro dos valores já pagos?
II – Respostas
II.A) POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA – INCLUSÃO DO AGENTE FINANCEIRO NO PÓLO PASSIVO.
Em regra, quando se tem o contrato de Abertura de Crédito e Mútuo para construção, este contrato é firmado entre Construtora e o Agente financeiro (por exemplo- CEF). Nesse contrato já consta previsão expressa quanto ao cronograma de obras, e por fim, data para a conclusão das obras. Sendo assim, a jurisprudência pátria é pacífica no sentido de ser solidária a responsabilidade entre instituição financeira e construtora decorrentes de atraso na execução de obra. Nesse sentido, já decidiu o eg. TRF da 4ª Região, verbis:
“ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO – SFH. CEF. REPARAÇÃO DE DANO MATERIAL E MORAL. RESPONSABILIDADE DA CEF E DA CONSTRUTORA. SOLIDARIEDADE. 1. Constatados vícios e atrasos na obra, há nexo de imputação de responsabilidade das Caixa Econômica Federal e da Construtora. 2. A construção do empreendimento está alicerçada sobre uma profusão de relações jurídicas e, dentre elas, a cooperação existente entre a empresa pública federal e a entidade organizadora antecede a celebração do contrato por instrumento particular de compra e venda de terreno e mútuo para construção de unidade habitacional. 3. O que ressalta da contratação é a solidariedade das rés na responsabilização da entrega da unidade habitacional, uma vez que à Construtora cabe a efetivação das obras no prazo contratado, na forma mais direta, e à CEF a fiscalização do cumprimento do referido prazo.” (TRF4 – AC: 50523808320124047100 RS 5052380-83.2012.404.7100, Relator: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Data de Julgamento: 24/02/2015, QUARTA TURMA, Data de Publicação: D.E. 26/02/2015)
Pelo exposto, observa-se que o cliente pode optar por demandar contra a o Agente Financeiro (CEF) e também a Construtora (responsáveis solidárias).
II.b) Sobre a Ilicitude da cobrança de juros de Obra.
A denominada “taxa de evolução da obra” (juros de obra) compõe-se dos juros cobrados pelas instituições financeiras face às construtoras. São decorrentes do empréstimo que a construtora faz com o banco para financiar o empreendimento imobiliário, cujo objeto é um imóvel residencial ainda na “planta” e que, com o tempo, repassa tais encargos aos compradores, direta ou indiretamente, pactuada ou dissimuladamente.
Em outras palavras, quem paga pelos juros do financiamento entre construtora e instituição financeira é o comprador, terceiro àquela relação. Neste quesito, tem-se existe cláusula contratual expressa e clara quanto a obrigação do adquirente de pagar juros durante a fase de construção do imóvel. Logo, entendo que, enquanto a obra se encontra em andamento, com observância do cronograma e do prazo estipulados no contrato, não há qualquer ilicitude quanto à cobrança do encargo.
Contudo, ultrapassado o prazo contratual para a entrega do imóvel, o mutuário é onerado com encargo para o qual não deu causa. Uma vez extrapolado o prazo de entrega da obra, tem-se configurado em favor do consumidor um quadro de excessiva onerosidade ao contratante.
II.C) O JUROS DE OBRA PODE CONTINUAR a incidir mesmo após a fase pactuada?
Se há demora injustificável da obra, sem culpa do comprador, mas da construtora e do agente financeiro que deixou de exigir o cumprimento do cronograma, o encargo se torna inexigível a partir do termo para o qual era previsto o final da obra.
Sendo assim, havendo atraso na construção, o consumidor não pode ser penalizado com a cobrança dos “juros de obra”, porquanto não teve responsabilidade pela mora. Logo, tanto a CEF, na condição de agente financeiro, como a construtora, devem se responsabilizar solidariamente por tais encargos quando ultrapassado o prazo para o término da fase de construção da obra, sem a efetiva entrega desta ao consumidor. Corroborando tal entendimento:
“CIVIL. FINANCIAMENTO. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. ATRASO NA ENTREGA DA CONSTRUÇÃO. TAXA DE OBRA. RESPONSABILIDADE. DANOS MORAIS. MULTA. 1. Nos casos de financiamento para construção de moradias populares, voltados para mutuários com baixa renda, o agente financeiro é parte legítima para responder, solidariamente, pelo imóvel cuja obra foi por ele financiada com recursos do Sistema Financeiro da Habitação. 2. Em havendo atraso na construção do empreendimento, não se pode penalizar o consumidor com a cobrança da “taxa de obra”, considerando que não foi ele quem deu causa ao atraso. 3. “A responsabilidade pelos danos advindos do atraso na entrega do empreendimento deve ser suportada solidariamente pelas rés, já que a Caixa tinha o dever de fiscalizar o andamento das obras antes do repasse das verbas”. 4. Os valores pagos a título de juros de obra deverão ser abatidos do saldo devedor, considerando-se na amortização da dívida. 5. Aplicação de multa de 2% (dois por cento) à Construtora e à CEF, sobre as parcelas pagas durante o período de atraso até a entrega da obra. 6. Condenação em R$ 10.000,00 (dez mil reais) em danos morais, valor adequado à dimensão do dano provocado – período entre a data prometida de entrega da obra, ano de 2012, até os dias atuais, e que deverá ser arcado, solidariamente, pelas rés. Apelações não providas.”(AC 08022269520144058400 AC – Apelação Cível – Desembargador Federal Élio Wanderley de Siqueira Filho – TRF5)
II.D) É possível formular o pedido de repetição em dobro dos valores já pagos?
Por fim, à vista da cobrança injustificável de juros durante o período de atraso na entrega da obra, pertinente é o pedido de restituição de todos os valores pagos.
Quanto ao pagamento em dobro de que cuida o parágrafo único do art. 42 do CDC: “O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”. Deve-se tomar bastante cautela, uma vez que os Tribunais tem se manifestado nos seguintes termos: – não há que se falar em restituição em dobro da quantia paga, tendo em vista que não restou evidenciada a má-fé na cobrança indevida, uma vez que esta estava albergada por cláusula contratual.
CONCLUSÃO
Configurado o atraso na conclusão do empreendimento, o consumidor não tem obrigação legal de arcar com os juros de obra, mostrando-se abusiva referida cobrança que resulta em injustificada vantagem e enriquecimento sem causa dos fornecedores.
Diante do exposto, é possível ajuizar ação em desfavor a Incorporação Imobiliária e do Agente Financeiro (CEF), solidariamente, que tenha ao final o pedido de restituição, simples, dos valores pagos a título de
“juros de obra” cobrados após o prazo limite para a conclusão das obras, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora, a partir da citação.
Artigo Elaborado pelo Advogado Júlio Leão